Modelo tributário brasileiro possui falhas estruturais e pode destruir o mercado atual, diz Regulus Partners

modelo tributário brasileiro

Em artigo publicado no Winning Post, a Regulus Partners compartilha sua visão sobre o modelo tributário brasileiro proposto pelo governo para o mercado de apostas esportivas no país.

O governo anunciou que irá “seguir o modelo do Reino Unido” de tributação das apostas online: com uma carga fiscal de 15% da GGR, o objetivo é garantir a eficácia da canalização dos mercados ilegais para o regime de licenciamento.

Em princípio, um imposto de 15% da GGR sobre apostas online parece sensato: funciona no Reino Unido, embora também existam taxas semelhantes nos Estados Unidos. No entanto, um imposto de 15% sobre a GGR com base no mercado britânico não é tão simples quanto parece.

Talvez, o governo tenha procurado o conselho do ex-secretário de saúde e cultura do Reino Unido, Matt Hancock, e do ex-chanceler da Fazenda, Kwasi Kwarteng, que recentemente foram flagrados fazendo trabalho de consultoria – apesar da falta de talento e/ou de percepção. O Brasil está caminhando para uma autodestrutiva e absurda armadilha política alimentada com bobagens que ajudará ao país a conseguir o contrário do que se pretende. Esta é, aparentemente, uma especialidade de ambos os ex-ministros britânicos.

O modelo atual proposto para apostas esportivas é profundamente falho em três níveis estruturais e, em nossa opinião, pode destruir o mercado atual.

Em primeiro lugar, e menos grave, a baixa taxa de imposto GGR não é o principal impulsionador da quota de participação de empresas específicas, independentemente do que a indústria possa querer. Quando a Dinamarca aumentou os impostos de 20% para 28% em 2021, as expectativas do setor de reduzir o market share das empresas não foram atendidas. Igualmente, nos Estados Unidos, não há correlação entre as taxas de imposto GGR para apostas online e renda per capita (na verdade, a correlação é perigosamente positiva graças a Nova Iorque, que tributa jogos de azar online em 51% do GGR). A redução dos impostos sobre jogos online de 25% para 20% da GGR na Espanha em 2018 coincidiu com uma desaceleração do crescimento, não uma aceleração.

Para isso, há uma explicação simples: além da tributação potencialmente distorcida dos prêmios, os impostos GGR não afetam os preços pagos pelo consumidor e, portanto, não afetam a demanda (operadores que ameaçam enganar os clientes aumentando os preços em resposta a impostos GGR mais altos são mentirosos e economicamente analfabetos, uma vez que irão simplesmente conceder uma vantagem de preço aos concorrentes – ou estão efetivamente propondo um cartel).

Em última análise, o que uma taxa de imposto mais alta realmente faz é reduzir a quantidade de dinheiro que os operadores têm disponível para gastar em marketing (supondo que os investidores tenham parado de injetar dinheiro em modelos de negócios falhos) – e, como grande parte deste alarde de marketing é autodestrutiva do ponto de vista da eficiência e das políticas, impostos mais altos não são necessariamente ruins.

Há pouca verdade em supor que pouco marketing faz o segmento de jogos crescer ou que influencia positivamente o conhecimento do produto. No entanto, no contexto brasileiro, um imposto de 15% da GGR não é apenas um conceito falho em termos de objetivos políticos pretendidos, e, sim, arriscado para a sustentabilidade fiscal.

A faixa típica de IVA/GST aplicada no Brasil é de 17% a 25%, o que significa que os atuais US$ 1,6 bilhão estimados para o mercado de apostas online são “potencialmente” (N.E.) monopolizados, gerando impostos de US$ 240 milhões. Todas as receitas futuras são, na melhor das hipóteses, neutras em termos de impostos, levando em consideração que o crescimento das apostas deve vir de outras partes da economia de consumo.

Contudo, um equívoco sobre o aumento da quota de participação de empresas específicas e a ineficiência fiscal está longe de ser o defeito mais grave da política de apostas esportivas no Brasil, em nossa opinião.

Um problema maior é que o imposto de 30% sobre os ganhos que se aplica à loteria também parece se aplicar às apostas esportivas. Atualmente, os prêmios de loteria abaixo de R$ 2.640 estão isentos de tributação, o que parece ser uma isenção significativa em um mercado relativamente emergente e relativamente massivo se esta isenção for transferida para as apostas esportivas. Entretanto, um imposto de 30% sobre os ganhos de prêmios mais altos é uma séria armadilha de aumento de participação de empresas específicas, tornando a taxa de imposto GGR praticamente irrelevante. Embora seja improvável que 90% dos clientes de apostas esportivas no Brasil atinjam esses níveis de ganhos, os 10% restantes representam mais de 70% da receita.

Por exemplo, acreditamos que o mercado de US$ 1,5 bilhão da GGR é suportado por 9 milhões de clientes ativos:

  • 90% ou 8 milhões de clientes = 20% da receita, ou US$ 40 de gasto líquido por cliente, a 10% do GM = US$ 400 em apostas e US$ 360 de lucro por ano, bem abaixo do limite total e muito menos por aposta.
  • 10% ou 1 milhão de clientes = 80% da receita, ou US$ 1.300 de gasto líquido por cliente, aos 8% do GM (mais apostas individuais) = US$ 16.600 em apostas e US$ 15.300 de lucro por ano. Uma proporção substancial dessas apostas individuais pode valer US$ 500 ou mais em lucros.

Em outras palavras, o imposto sobre o lucro visa os clientes mais valiosos, mais inteligentes, e mais sensíveis ao preço e com maior mobilidade. Mesmo com um limite de US$ 500 sobre os ganhos, até 80% da receita pode não passar, e o mercado ilegal provavelmente prosperará. Ao manter o imposto com um limite de US$ 500, o propósito explícito da política de 15% da GGR seria completamente anulado.

Em nossa opinião, a terceira falha estrutural provavelmente será fatal para todo o projeto, especialmente se combinada com o imposto sobre os ganhos. O maior e possivelmente o mais intratável problema é que o governo brasileiro está muito mais disposto a regular as apostas esportivas do que os jogos de azar. Na semana passada, o governo parecia confirmar que uma licença brasileira de apostas esportivas impediria a oferta de jogos online e que isso seria revisto posteriormente (provavelmente muito mais tarde).

Já faz algum tempo que apontamos este risco, como resultado das forças políticas em ação, mas é a primeira vez que um funcionário público fala sobre o assunto. Ao bloquear o jogo online, aproximadamente 50% do mercado existente para o produto torna-se ilegal. No entanto, isto é muito pior do que “simplesmente” reduzir pela metade o atual mercado quando combinado com o imposto sobre ganhos de 30%, já que fornece um motivo adicional poderoso para os clientes existentes usarem o mercado negro, pois os clientes de jogos e de apostas – ou apenas de jogos – são geralmente muito mais valiosos per capita do que os clientes de apostas individuais. O atual pacote tributário proposto atinge aproximadamente 80% do mercado online atual e o torna disfuncional.

O pacote de apostas esportivas brasileiro, sem dúvida, abrirá uma oportunidade física omnichannel significativa, que acreditamos que pode valer um bilhão de dólares em receita adicional – ou talvez mais.

Por outro lado, este novo mercado provavelmente será dominado por alguns players locais inteligentes e bem posicionados e poderia atrair os interesses de regulamentação tributária das províncias brasileiras semi-autônomas e financeiramente pressionadas pressionadas financeiramente: a necessidade de uma rede física abre uma óbvia oportunidade de adicionar impostos locais.

Contudo, da receita de US$ 2,3 bilhões até 2023, esperamos que menos de 30% – ou US$ 650 milhões -, sobrevivam em uma forma regulamentada nacionalmente se tributados e regulamentados conforme proposto.

Uma indústria deste tamanho representaria um GGR de US$ 2 bilhões, com arrecadação de cerca de US$ 300 milhões em impostos GGR, bem abaixo dos US$ 2 bilhões ou US$ 3 bilhões que o governo espera com bastante otimismo (esperamos que a maioria dos impostos sobre ganhos seja evadida no mercado negro). De fato, se a alta esperada de US$ 3 bilhões fosse composta por 60% de GGR e 40% de imposto sobre ganho (o que implica um imposto combinado de 11% sobre o ganho com um limite de US$ 500), implicaria um GGR de mercado de US$ 12 bilhões – ou US $ 56 per capita, mais do que Nova Iorque informa atualmente… A diferença entre uma declaração de imposto de US$ 3 bilhões e US$ 300 milhões é mais do que a diferença entre sucesso e fracasso: significaria um desastre político total para o jogo e todos aqueles que apoiaram a regulamentação local.

Ironicamente, mas talvez inevitavelmente, a indústria provavelmente será culpada pelas fracas declarações fiscais e pelo marketing agressivo por ação que o regime proposto quase inevitavelmente introduzirá no próximo ano, atrasando indefinidamente a probabilidade de uma reforma positiva nos impostos sobre ganhos e sobre os jogos online.

O Brasil pode copiar o Reino Unido, mas em incompetência ministerial, não em política efetiva, a nosso ver. Mais uma vez, vários anos de lobby intensivo da indústria, mas ingênuo e simplista, alcançaram exatamente o oposto do que se pretendia e está rapidamente se tornando outra confusão política evitável, mas potencialmente catastrófica.