Andre Gelfi: a importância da política de jogo responsável para o mercado

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O setor de apostas esportivas está prestes a ser regulamentado no Brasil. Fernando Haddad, ministro da Economia, declarou que a Medida Provisória (MP) para taxar a indústria será encaminhada para análise e aprovação até o final deste mês.

Embora não haja definição de percentuais de impostos a serem cobrados, o debate atual refere-se ao jogo responsável: como proteger jogadores e empresas de fraude em apostas, da ludopatia (vício em jogo) e da lavagem de dinheiro?

À espera da regulamentação das apostas esportivas, alguns dos operadores mais importantes do cenário em atuação no Brasil anunciaram a criação do Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR).

Em conversa esclarecedora com a SBC Notícias Brasil, Andre Gelfi, diretor-presidente do IBJR e sócio-diretor da Betsson no país, explicou os objetivos do Instituto e como planejam colaborar com a indústria de apostas, quando regulamentada, para evitar e resolver eventuais problemas.

SBC Notícias Brasil: Quais serão os pilares do Instituto para contribuir com a regulamentação?

Andre Gelfi: Estando envolvido [no mercado de apostas], me sinto muito responsável, como indivíduo, por fazer o que está a meu alcance – inclusive, estando em uma posição de liderança em uma empresa relevante e referência no segmento. Isso deve ser prioridade na minha agenda como cidadão, não apenas como presidente do Instituto.

O Instituto Brasileiro de Jogo Responsável surge como uma alternativa para aproximar a discussão destes assuntos regulatórios do Brasil. Até então, os membros do Betting and Gaming Council (BGC), na Inglaterra, faziam isso de forma remota. A interação é mais difícil pela distância e pela dificuldade com o idioma. Estamos criando o IBJR no Brasil, e toda a base de conhecimento, por enquanto, está sendo trazida do BGC. É um órgão que possui experiência e reúne os maiores players do nosso segmento e é uma biblioteca muito interessante para nós. 

Nossa ideia não é, exclusivamente, replicar o BGC, uma vez que estamos no Brasil – e as circunstâncias e a jurisdição são outras. No entanto, do ponto de vista de conhecimento histórico, o BGC é uma referência, grande fonte de informação para o IBJR em um primeiro momento. Temos uma relação muito fluida e harmônica com os membros do BGC – alguns são os fundadores do Instituto no Brasil -, e acredito que, com o tempo, estejamos maduros o suficiente para conseguirmos cumprir nossa missão com base na experiência local.

Hoje, não temos um mercado regulado, e é natural que estejamos buscando conhecimento fora do país. A partir do momento em que o mercado estiver localizado, este conhecimento será nutrido pela própria experiência que iremos acumular. As empresas que fazem parte do Instituto possuem licenças no Reino Unido, na Suécia, em Malta, na Holanda, na Itália, nos Estados Unidos, no Canadá e na América Latina. São empresas que possuem experiência e distintas perspectivas sobre o assunto. Facilita compilar as melhores práticas para dialogar com as autoridades brasileiras que estão fazendo, pela primeira vez, este trabalho no Brasil.

Nós temos a pretensão de sermos referência na discussão do assunto jogo responsável no país com promoção de eventos e de discussões e a troca de perspectivas, por exemplo, entre médicos, psicólogos, operadores e veículos de imprensa. Dar visibilidade a esta discussão é frutífero. Temos o papel de facilitar este encontro de perspectivas, a identificação de problemas e a busca de soluções. O Instituto possui este papel fundamental.

Estamos, hoje, tratando com o governo a iminência da regulamentação, este é só o começo de uma longa trajetória. A partir do momento em que tivermos um mercado regulado no Brasil, começará, de fato, o papel do Instituto Brasileiro de Jogo Responsável. O Instituto antecipa a abertura do mercado – o que é bacana, pois ajustar é sempre mais difícil do que construir corretamente.

SBC Notícias Brasil: Que garantias relacionadas ao jogo responsável você acha que serão incluídas como primeiras medidas da regulamentação?

Andre Gelfi: Eu imagino que este assunto esteja abordado na regulamentação, a qual provavelmente será pública no curto prazo. Eu acho que este assunto é dos mais relevantes dentro do segmento, e espero que os reguladores brasileiros, debruçados sobre este assunto há muito tempo, tenham olhado para ele com o devido cuidado e que isso seja parte do regramento que será publicado – medidas, melhores práticas e orientação em relação ao jogo responsável.

Os membros fundadores já adotam práticas necessárias, por serem licenciados em diversas jurisdições de referência. Entre os fundadores do IBJR, temos empresas pioneiras neste assunto na Europa. De certa forma, o Reino Unido e os países escandinavos, por terem mercados mais maduros e serem uma referência, inclusive, dentro da Europa, lideram a vanguarda desta discussão sobre o jogo responsável – que ainda acontece no norte da Europa. 

Me sinto responsável por ser líder de uma empresa, que é reconhecida como referência, e de estar à frente de um instituto que leva a responsabilidade no nome, de zelar por um mercado que está na iminência de ser regulamentado, onde o [debate] sobre a regulamentação, o regramento e a forma como esse mercado irá se formalizar está acontecendo. Neste contexto, a oportunidade e a necessidade deste Instituto cristalizaram-se. Estamos, hoje, com as condições certas para nutrir esta conversa da melhor forma possível, ajustada à realidade brasileira.

Então, sim, imagino que esta questão será abordada. O que não estiver, a nossa pretensão é orientar não apenas os operadores e os fornecedores brasileiros, mas também a sociedade para que isso seja orgânico e esteja permeado em todo o ecossistema – esta consciência e as práticas – para que mitiguemos este problema, para que o problema da compulsão seja basicamente olhado de frente e com a devida atenção.

SBC Notícias Brasil: Que tipos de soluções você pode propor para se ter um ambiente seguro para apostas no Brasil?

Andre Gelfi: A nossa visão é facilitar o que entendemos que é o ideal dentro do universo existente. De forma alguma queremos impor algo ao governo. Quem toma a decisão é o governo brasileiro. Nós facilitamos as informações e apresentamos os mercados regulados, as práticas adotadas, se concordamos com as medidas implementadas em outros países e como faríamos no Brasil. 

Nós assessoramos, oferecemos suporte, respondemos dúvidas. Estamos aqui para servir, porque entendemos que é relevante e pode trazer bons frutos. Acreditamos que temos um papel fundamental para ajudar o ministério da Economia, especificamente, a trabalhar nesta questão diretamente do Brasil. Estamos trabalhando de forma coordenada. Até então, trabalhávamos [as empresas] cada um por si e, agora, faremos isso a partir do Instituto.

SBC Notícias Brasil: Ao anunciar o lançamento do IBJR, você mencionou lavagem de dinheiro como uma questão sensível. Que passos o Brasil pode dar para evitar este tipo de problema?

Andre Gelfi: O Brasil, em termos de sistema financeiro, é um país bastante desenvolvido e que possui ferramentas e tecnologias que facilitam os controles necessários para evitarmos práticas suspeitas e que podem derivar de lavagem de dinheiro.

O Pix, com a possibilidade de saber de onde vem e para onde irá o dinheiro, possibilita criar as devidas restrições para que só se aceite depósitos de quem diz ser, fazer a validação de cadastro (KYC – Know Your Customer) e apenas permitir que a conta de usuário receba fundos de uma conta bancária de mesmo CPF – e o mesmo aplica-se a saques. Esta medida é fundamental. 

Dependendo do valor do depósito e do valor do resgate, os controles adotados e os documentos solicitados tornam-se mais rigorosos, a fim de poder identificar se há algo que possa estar relacionado à lavagem de dinheiro.

SBC Notícias Brasil: Quando a regulamentação for finalmente aprovada, vocês trabalharão ou com diferentes estados para garantir um ambiente seguro com aconselhamento personalizado, ou a perspectiva do IBJR é mais federal?

Andre Gelfi: Se existe uma regulamentação estadual, a interação estadual parece natural. Não sei se existe uma predileção por fazer de uma forma ou de outra. Acredito que irá de acordo com a necessidade e com a evolução do mercado. É difícil de vislumbrar, atualmente, porque há diversas discussões acontecendo nos âmbitos estadual e nacional. Por enquanto, a questão federal recebe muita atenção, uma vez que o ministro da Economia disse que a regulamentação pode se concretizar nas próximas semanas. A questão estadual deve progredir, e o capítulo do jogo responsável é inerente ao jogo. Temos de olhar para isso conforme a evolução do mercado de jogos.