A Advocacia-Geral da União (AGU), recorreu ontem, 12, de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que determinou que o Governo a adoção de ferramentas para impedir que beneficiários do Bolsa Família e outros programas sociais utilizem recursos recebidos do Estado para apostar.
De acordo com apuração realizada pela Folha de São Paulo, o órgão jurídico afirmou que o executivo não tem meios técnicos para proibir esse tipo de gasto, já que não é possível distinguir o dinheiro do benefício de outros montantes recebidos pela família em uma determinada conta bancária.
Áreas técnicas do governo também apontaram que, assim que o benefício é repassado para a conta da família cadastrada no programa social, o dinheiro passa a ser do titular, com o poder público perdendo qualquer influência que tinha sobre sua destinação.
A petição foi apresentada em forma de embargos de declaração, instrumento jurídico usado para solicitar esclarecimentos de pontos de uma decisão judicial. A AGU solicita que o STF indique como o governo deve proceder com a determinação, dado os obstáculos citados, e pede um prazo razoável para implementação das medidas.
A AGU utilizou como base argumentos técnicos e dados da Secretaria de Prêmios e Apostas do Ministério da Fazenda (SPA/MF) e da Secretaria Nacional de Renda de Cidadania (Senarc) do Ministério do Desenvolvimento Nacional.
De acordo com o Senarc, a conta bancária de pagamento dos benefícios do Bolsa Família usada por 99% das famílias contempladas pelo programa não é de uso exclusivo, e pode movimentar valores oriundos de outras fontes, como o trabalho.
“Em relação às contas de pagamento do Bolsa Família, apenas 9,67 milhões de responsáveis familiares fazem regularmente Pix a partir da conta de benefício e, em média, fizeram apenas 2,5 operações, com um valor de R$ 355 cada (dados de agosto/2024). Ademais, as mais de 9,67 milhões de famílias que fizeram pix movimentaram cerca de R$ 8,5 bilhões, mas só receberam R$ 6,5 bilhões do programa, logo, é imprescindível compreender que um eventual bloqueio da conta invade esfera privada, onde o cidadão movimenta outras rendas”, afirma o documento.
Neste mesmo documento, a AGU afirma que não pretende rediscutir a decisão ou manifestar discordância com as “premissas conceituais constantes do acórdão embargado, as quais estão alicerçadas em preceitos constitucionais voltados à defesa da saúde mental, especialmente das crianças e adolescentes, assim como à proteção econômica de indivíduos e famílias vulneráveis”.
“Desse modo, conquanto louvável e necessária a preocupação com a situação econômica de indivíduos e famílias vulneráveis, a adoção de «medidas imediatas» encontra barreiras de ordem prática de difícil superação, razão pela qual faz-se imprescindível o aclaramento do acórdão recorrido, também quanto a esse ponto, de sorte a se identificar a forma pelo qual deva ser cumprido, em salvaguarda dos preceitos constitucionais que a concessão parcial da medida cautelar buscou garantir” diz a AGU.
O órgão também solicita maiores esclarecimentos sobre outros pontos da decisão judicial que, na avaliação do Governo Federal, ficaram dúbios: “Os presentes embargos buscam aclarar os limites da eficácia do acórdão proferido por essa Suprema Corte, no ponto em que determina ‘a implementação de medidas imediatas de proteção especial que impeçam a participação nas apostas de quota fixa com recursos provenientes de programas sociais e assistenciais; como o Bolsa Família, o Benefício de Prestação Continuada e congêneres’”.
“Sobre a expressão ‘congêneres’, vale registrar que, além dos diversos programas de benefícios sociais existentes na esfera federal, que não foram exaustivamente especificados no julgado, há também inúmeros benefícios estaduais, não sendo possível depreender da decisão em exame se estes também devem ser incluídos no impedimento de utilização de seus recursos para a realização de apostas de quota fixa”, afirma a AGU.
O Governo também solicita que o STF indique se, com a decisão, os estados também estão obrigados a respeitar as regulamentações do Ministério da Fazenda referentes à exploração comercial da modalidade lotérica de aposta de quota fixa, que inclui regras restritas de funcionamento, fiscalização e publicidade.
O Ministro Luiz Fux, na decisão, também antecipou a vigência da Portaria nº 1.231/2024, que versa sobre jogo responsável, publicidade e marketing. Desta maneira, ficou proibida de maneira imediata qualquer tipo de publicidade direcionada a crianças e adolescentes.