Presidente da Anatel sugere aumento de poderio regulatório ao órgão

Presidente da Anatel afirma que órgão não consegue garantir bloqueio de sites de apostas ilegais

Carlos Baigorri, presidente da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), disse que, atualmente, a Anatel não consegue garantir que a lista de bloqueio do Ministério da Fazenda (MF) seja efetivamente seguida. O órgão possui competência legal para determinar ordens, fiscalizar e punir agentes de telecomunicações.

O presidente também reforçou a necessidade de ferramentas legais mais poderosas para que seja efetivo o bloqueio das casas de apostas consideradas ilegais segundo o crivo da Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA)

“Do jeito que está hoje, a gente está enxugando gelo, e o bloqueio que tem é muito pouco efetivo. Botaram uma batata quente no meu colo, e estou falando: isso [baixa efetividade] vai ficar ruim para o governo todo”, disse Baigorri em entrevista à Folha.

Segundo o presidente, a Anatel fiscaliza com mais precisão as maiores casas de apostas, que possuem entre 80% e 90% dos acessos dos usuários. No entanto, afirmou que o órgão não tem recursos para monitorar 100%. A fim de melhorar a aparelhagem tecnológica, seriam necessários R$ 7,5 milhões, a fim de otimizar o acompanhamento das suspensões. 

Não é a primeira vez que Baigorri traz esse assunto à tona. Em audiência pública do Supremo Tribunal Federal (STF) realizada nos dias 11 e 12 de novembro, o presidente afirmou que seriam necessárias outras ferramentas tecnológicas e mudar a legislação para punir empresas que atuam no mercado paralelo.

Durante a audiência, Baigorri destacou que os sites possuem muitas “formas de burlar” essas restrições: “Hoje, o Estado brasileiro não tem condições de garantir que esse bloqueio seja efetivo”.

Operador DNS

O presidente explicou que há diversas dificuldades em seguir a lista de bloqueio do MF, especialmente a falta de poder regulatório sobre o operador de Domain Name System (DNS), que converte nomes de domínios em números legíveis, o IP, que pode ser lido por máquinas. E o operador tem uma lista com todos esses domínios.

A Anatel recebe do MF, por meio da SPA, a lista de domínios de sites considerados ilegais, a partir disso determina que empresas de telecomunicações bloqueiem o acesso a esses endereços. O bloqueio de sites ilegais é feito a partir do endereço de IP das operadoras. 

Contudo, Baigorri explicou que é possível para operadoras burlarem a lista de bloqueio da seguinte maneira: elas pedem ao operador de DNS que substituam o número de IP na lista por outro que esteja fora do bloqueio – assim como foi visto com o “X” durante o bloqueio no Brasil por determinação judicial.

Por isso seria extremamente difícil conseguir o bloqueio dos mais de 5 mil sites ilegais solicitados pelo MF. É como “um jogo de gato e rato”, já que o órgão precisa ir atrás dos novos domínios inseridos, e é um movimento que pode se repetir sem parar. No meio tempo, as operadoras ilegais continuam no ar.

“A Anatel não tem um botão vermelho que derruba os sites do ar”, afirmou. “A gente comunica todas as empresas de telecomunicação. São 20 mil, grosso modo, porque a gente está falando das grandes, mas [também] essas pequenininhas do interior do Brasil. Quando você fala de 3.000 sites em 20 mil redes, são 60 milhões de verificações. Hoje, a gente não tem como garantir que o bloqueio está sendo efetivado.”

Para o presidente, uma das maneiras de lidar com o problema é ampliar o poder do órgão em uma alteração da Lei Geral de Telecomunicações, dando poder regulatório para fiscalizar e sancionar.

“Se o Estado quer ter algum poder de mando no ambiente da internet, esses agentes precisam também estar submetidos ao controle do Estado”, afirmou.

Anatel não apoia inconstitucionalidade das apostas

No começo do mês, o ministro Luiz Fux convocou a uma audiência no âmbito da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7721. Nesta, a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) solicitou ao STF a declaração de inconstitucionalidade da Lei nº 14.790/2023.

“Se a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) for acolhida, acaba, contrariamente ao seu próprio objetivo, fazendo aquilo que ela busca proibir ou evitar, que é o incentivo ao jogo patológico, ao jogo ilegal”, afirmou Pietro Cardia Lorenzoni, advogado e diretor jurídico da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), durante a audiência.

Segundo dados da ANJL, apenas em 2025, o mercado regulado de apostas do Brasil produzirá aproximadamente 60 mil postos de trabalho e arrecadará cerca de R$ 4 bilhões com as outorgas federais, além de impostos corporativos tradicionais – de quase 37% do faturamento da empresa.

Baigorri se mostrou contra a inconstitucionalidade das apostas durante a entrevista, reforçando que não haverá efeito proibir apostas e jogos on-line. “Não tem como colocar o gênio de volta na lâmpada”, comentou.

Apesar disso, teceu críticas ao modelo de regulamentação aplicado no Brasil, com centralização na SPA e também com as divergências entre o MF e o Ministério do Esporte com relação ao peso do mercado na atuação de times de futebol.

“Se você quiser seguir o livro-texto de regulação, primeiro [precisa de] um colegiado, não é um cara sozinho. Depois, toda regra que for fazer tem que ter análise de impacto regulatório, consulta pública, discutir com os agentes. O pessoal decidiu regular, mas não está seguindo o livro-texto da regulação”, finalizou Baigorri.

+ ANJL: eventual declaração de inconstitucionalidade da Lei das Apostas garantirá funcionamento do mercado ilegal

+ Governo solicita à Anatel o bloqueio de mais de 1800 sites de apostas ilegais no Brasil

+ ANJL afirma que tributação excessiva de apostas pode manter “jogador no mercado ilegal”