Brasil em Análise: da publicação da MP das apostas à CPI da Manipulação no Futebol

Brasil em análise

No dia 25 de julho, Luiz Inácio Lula da Silva assinou e publicou a Medida Provisória (MP) n° 1.182/2023, regulamentando as apostas esportivas no Brasil. A movimentação para um mercado local regulamentado abriu as portas para discussões mais aprofundadas sobre impostos a operadores e a apostadores, integridade esportiva e publicidade. 

O SBC Notícias Brasil reuniu as notícias mais importantes desde julho deste ano, a fim de informar os leitores sobre a indústria de apostas esportivas que mais cresce no mundo.

MP das apostas é publicada

O Brasil, o país do futebol, está em 1º lugar na lista dos países que mais acessam sites de apostas esportivas. A indústria cresce vertiginosamente desde sua legalização, em 2018. No dia 25 de julho, abriram-se as portas para um mercado regulamentado – a Medida Provisória (MP) n° 1.182/2023, que regulamenta o mercado de apostas de quota fixa no país, foi publicada no Diário Oficial da União.

A autorização para operação funcionará por meio de outorga de licenças ilimitadas, que permitirão a exploração de apostas esportivas físicas e on-line. Se mantido o texto após a votação da MP no Congresso, os operadores deverão pagar 18% do GGR ao Estado, e os apostadores precisarão declarar quaisquer ganhos e pagar 30% de Imposto de Renda (IR) sobre os prêmios, caso o valor recebido ultrapasse a faixa de isenção do IR de R$ 2.112.

Entretanto, a Câmara dos Deputados ameaçou não votar a MP das apostas, para que o texto perca efeitos legais devido ao fim do prazo de 120 dias, prorrogável por mais 60 dias, que o Congresso Nacional possui para verificar a MP das apostas. 

Parlamentares ligados a Arthur Lira, presidente da Câmara, disseram, em entrevista à CNN, que desejam adicionar regras de tributação, já previstas pela MP, a um PL das apostas, o qual tramita em caráter de urgência e foi enviado pelo Executivo em julho.

Emendas à MP das apostas

Com a publicação da MP, 244 emendas foram protocoladas solicitando algum tipo de alteração ao texto do documento. Algumas sugerem a adição de entidades para a destinação das receitas; outras, manifestam o interesse em alterações na participação daquelas que já estão descritas na MP. Ainda, solicita-se liberar cassinos, jogos do bicho e jogos de bingo.

O ministro do Turismo, Celso Sabino, revelou que negociará com representantes do Congresso Nacional a obtenção de um percentual dos impostos sobre a indústria das apostas esportivas. Já o deputado do REPUBLICANOS do Tocantins, Ricardo Ayres, propôs que parte do valor arrecadado com as apostas esportivas seja utilizado para financiar o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES) e o Programa Universidade para Todos (ProUni)

O deputado federal Túlio Gadelha, do Rede de Pernambuco, apresentou uma proposta de repasse de taxas das apostas esportivas para a cultura. No documento, o Gadelha defendeu o repasse de 1,5% do total arrecadado em apostas esportivas para o Fundo Nacional da Cultura.

A bancada evangélica da Câmara também manifestou-se contrária à MP. Sóstenes Cavalcante, antigo líder da bancada do PL no Rio de Janeiro e vice-presidente da Frente Parlamentar Evangélica (FPE), e Cezinha de Madureira, do PSD de São Paulo, foram ouvidos pela CNN e afirmaram que a MP das apostas é uma “afronta à fé evangélica” e que o governo deveria “combater os jogos de azar”.

Repercussão da MP das apostas

Dias depois da publicação da MP, Andre Gelfi, diretor-presidente Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR), disse que a tributação sobre a receita bruta (GGR) dos operadores foi alterada, uma vez que se esperava que os impostos sobre o GGR fossem de 16%. O texto publicado, no entanto, prevê 18%. De acordo com o IBJR, o índice é 260% superior ao da lei vigente, que era de 5%.

Com a incidência de impostos, como PIS, COFINS e ISS, a carga tributária chegará a, aproximadamente, 30%. Se a MP for aprovada pelo Congresso sem modificações, “colocaria o Brasil entre as maiores cargas tributárias do planeta para o setor”, alertou o Instituto.

“[A carga] deve ser vista com ceticismo pela sociedade brasileira, pois toda a cadeia econômica derivada deste setor de apostas esportivas deve ser impactada. […] Outra consequência será o crescimento do mercado paralelo, tanto físico como on-line, já que as empresas que operam legalmente poderão repassar custos aos apostadores e estes, por sua vez, tendem a procurar alternativas mais atrativas”, afirmou Gelfi.

Concordando com Gelfi, Hazenclever Lopes Cançado, presidente da Loteria Estadual do Rio de Janeiro (Loterj), manifestou-se sobre o assunto. Em sua conta oficial no LinkedIn, Cançado disse que “o valor elevado da taxação das apostas esportivas federais no Brasil […] chega a 18% do GGR e pode alcançar 30% com o somatório de impostos previstos, é motivo de preocupação das casas de apostas que desejam se regularizar para operar no país e do Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR)”.

Contudo, Cançado acredita que o cenário proposto pela MP das apostas pode ser favorável para as loterias estaduais: “a Loterj segue com o Edital de Credenciamento para apostas esportivas em operação com valor de Outorga Fixa em R$ 5 milhões, por cinco anos de atividade, mais 5% do GGR ao mês referente à Outorga Variável”.

Futebol feminino

A Copa do Mundo Feminina da FIFA atingiu o pódio nas casas de apostas on-line. Em um levantamento realizado pela Novibet, o Mundial Feminino ocupa o terceiro lugar da lista dos cinco campeonatos mais apostados. 

O Brasileirão é o primeiro colocado, seguido pelos amistosos entre os grandes times da pré-temporada europeia. Nas quarta e quinta posições, encontram-se o Campeonato Brasileiro da Série B e o Campeonato Argentino, respectivamente.

Além disso, a plataforma informou que o Brasil foi a seleção que mais recebeu apostas entre julho e a primeira quinzena de agosto. Estados Unidos, França, Canadá e Argentina completam a lista das cinco primeiras seleções. Na televisão, a Copa do Mundo Feminina bateu recordes de audiência e superou dados de torcedores nos estádios da Austrália e da Nova Zelândia.

Patrocínios femininos

A jogadora de futebol Formiga foi anunciada como a “capitã” do time de embaixadores da marca da Pagbet, casa de apostas esportivas do Grupo NSX. A casa de apostas também conta com outras embaixadoras no Brasil, como a zagueira da Seleção Brasileira Kathelen e a jogadora do Flamengo Thais Regina.

Concomitantemente ao contrato feito com Formiga, a Pagbet lançou a campanha “O legado de uma guerreira – Formiga”, criado pela Lean Agência e veiculado em canais de TV aberta e em mídias sociais. A ação publicitária, narrada pela jornalista e embaixadora da Pagbet, Monique Cardone, reúne momentos importantes da carreira da atleta.

Ao lado da embaixadora Milene Domingues e do canal CazéTV, do streamer Casimiro Miguel, a casa de apostas on-line Aposta Ganha participou da cobertura da Copa do Mundo Feminina da FIFA 2023. 

A Aposta Ganha é a primeira plataforma de apostas esportivas a ter uma mulher como embaixadora – a ex-jogadora de futebol já participou de uma Copa do Mundo. Com a parceria do CazéTV, trouxeram conteúdos exclusivos, incluindo entrevistas com as atletas brasileiras, cobertura dos treinos e transmissão das partidas. Juntos, acompanharam a Seleção Brasileira até sua última aparição no Mundial.

BetGol777 e Debinha, atacante da Seleção Brasileira, assinaram acordo de parceria. O contrato, válido por seis meses, torna a atleta embaixadora da marca no país. A camisa 9 já possui contratos de patrocínio com empresas nacionais e internacionais, como Cimed, Coca-Cola, Nike, Sensodyne e Visa. Debinha, embora afirme que não imaginasse ser apoiada dessa maneira, está “feliz e honrada” com o novo acordo.

No fomento do esporte feminino, também está a Betsson. A casa de apostas sueca juntou-se ao StarScout para realizar uma ação social exclusiva para mulheres no futebol. A operadora é, hoje, a maior apoiadora do grupo idealizador do projeto.

Durante 30 dias, o StarScout percorreu o país em busca de atletas que desejam jogar profissionalmente. O projeto acompanhou 16 atletas, entre 18 e 25 anos, que poderão atuar profissionalmente. O StarScout possui parceria com universidades americanas, a fim de oferecer bolsas de estudos para atletas. As jogadoras selecionadas receberão propostas de trabalho.

A operadora de jogos e de apostas EstrelaBet também ingressou na luta pelo esporte feminino. A empresa assinou um acordo regional para se tornar patrocinadora da Copa do Mundo Feminina da FIFA no Brasil. A EstrelaBet é, até o momento, a única operadora brasileira a apoiar a competição, que começa esta semana na Oceania.

O patrocínio não é o primeiro da operadora relacionado ao futebol feminino. A marca possui parceria com clubes nacionais, como Internacional, América MG, Ceará e Remo, além de patrocinar a CBF Futsal e o Campeonato Gaúcho Feminino do ano passado.

Integridade esportiva

Segundo a MP das apostas, operadores devem firmar convênio com entidades de integridade esportiva para atuarem legalmente no Brasil.  A casa de apostas Galera.bet, operada pela Match Time Solutions BV e voltada ao público brasileiro, agora faz parte da The International Betting Integrity Association (IBIA). O objetivo da parceria é detectar e prevenir a corrupção esportiva, fornecendo produtos e serviços confiáveis a todos os apostadores brasileiros. 

Em maio deste ano, a IBIA anunciou que aumentaria sua atividade de monitoramento contra a manipulação de resultados no Brasil. A Associação, então, assinou um acordo com o IBJR, a fim de reforçar o combate à manipulação de resultados e promover a credibilidade dos eventos esportivos e das apostas on-line no país. 

Um relatório independente será divulgado em uma seção especial da Comissão de Esportes da Câmara de Deputados e da Sports Integrity Global Alliance (SIGA) no dia 5 de setembro. O relatório, que promove um debate estratégico para modernizar o futebol nacional, busca reunir representantes de vários setores para discutir os desafios e as reformas necessárias.

Casos Paquetá & Luiz Henrique

Lucas Paquetá e Luiz Henrique, jogadores do West Ham e do Real Betis, respectivamente, estão sendo investigados por suposto envolvimento em um esquema fraudulento de apostas. Devido às acusações, ambos os atletas foram convocados pela CPI da Manipulação no Futebol para prestarem depoimento.

A investigação trabalha em três jogos em que Paquetá foi advertido. A inquirição chegou a um ponto de inflexão após alerta de integridade pelo cartão amarelo recebido no jogo do West Ham contra o Bournemouth, no último minuto, no dia 12 de agosto.

As apostas, possivelmente fraudulentas, teriam sido feitas na plataforma Betway, patrocinadora oficial do West Ham, nos cartões amarelos de Paquetá, diretamente da Ilha de Paquetá, na Baía de Guanabara, no Rio de Janeiro, onde o atleta cresceu. O atacante do Betis, Luiz Henrique, também faria parte do esquema, que entrou em campo aos 58 minutos e recebeu um cartão amarelo aos 89.

Devido ao modo de aposta selecionado, os usuários apenas receberiam os ganhos se ambos os jogadores levassem cartão amarelo.

CPI da Manipulação no Futebol

A CPI da Manipulação no Futebol, instaurada no dia 17 de maio na Câmara dos Deputados, a partir de suspeitas de fraudes levantadas em quatro jogos da Série B do Brasileirão, foi prorrogada por mais 60 dias. O prazo para conclusão da CPI, agora, é até 13 de novembro, a contar da data estipulada para sua finalização, prevista para 14 de setembro. 

A Comissão chegou a receber, inclusive, Andre Gelfi e Wesley Cardia, presidentes do Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR) e da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), respectivamente. A reunião abordou temas relacionados à manipulação de resultados, ao jogo responsável e à transparência nas operações.

Na luta contra a manipulação de resultados, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) enviou uma carta à FIFA solicitando que as sanções por fraude em apostas esportivas aplicadas pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) sejam estendidas globalmente. Para a CBF, a punição em casos de manipulação de resultados deve ser estendida às 211 federações filiadas à FIFA.

Loterias

O quadro de diretores da Federação Brasileira das Empresas Lotéricas (FEBRALOT) teve um encontro com representantes do Ministério da Fazenda. Entre as autoridades presentes, estavam José Francisco Manssur e Simone Vicentini, coordenadora de Loterias do Ministério da Fazenda.

De acordo com o portal BNLData, o objetivo da reunião foi estabelecer proximidade da Federação ao ministério de Fernando Haddad para colaborar com o desenvolvimento das loterias no país, principalmente após a publicação da MP das apostas.

Recentemente, a Associação dos Intermediadores Digitais de Jogos Lotéricos (AIDIGLOT) solicitou ao Ministério da Fazenda um posicionamento em relação à volta das Loterias Instantâneas e Raspadinhas (Lotex).

O pedido de esclarecimento é consequência das declarações publicadas pela imprensa recentemente. Na semana passada, a presidente da Caixa, Rita Serrano, comentou que estão se preparando para voltar a assumir a loteria instantânea. As afirmações seriam contrárias ao que foi acordado durante uma reunião oficial. 

“É de pleno conhecimento do mercado lotérico, assim como do mercado financeiro, o comprometimento da equipe do MF [Ministério da Fazenda] com combate a qualquer outro retrocesso regulatório. Nesse sentido, causa-nos surpresa que a presidente da Caixa, que é uma empresa pública vinculada ao MF, faça uma declaração que gera insegurança para o mercado de loterias”, pontuou Mirko Mayeroff, presidente da AIDIGLOT. 

Ainda, a Loterias do Estado do Paraná (Lottopar), conforme informado pela Corporación Iberoamericana de Loterías y Apuestas del Estado (Cibelae) em meados de agosto, os laboratórios de testes e de certificação da indústria de jogos terão maior abrangência no Brasil. Segundo a Lottopar, a autarquia já está em processo de credenciamento desses laboratórios por meio do edital nº 2/2023.

A iniciativa pioneira proporciona o desenvolvimento das operações de forma mais segura e transparente, uma vez que o Brasil tornou-se um dos principais mercados do mundo dos jogos – principalmente após a Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (SG/Cade) instaurar o Inquérito Administrativo nº 08700.003430/2023-01 para apurar infrações relacionadas à ordem econômica no mercado de jogos lotéricos, as quais envolveriam a Caixa Econômica Federal (CEF) e a Federação Brasileira das Empresas Lotéricas (Febralot).

Lotéricas abrem Edital de Credenciamento para empresas de apostas

Na segunda quinzena de agosto, a operadora brasileira PixBet visitou a sede da Loteria do Estado do Rio de Janeiro (Loterj), representando a integração entre a operadora e a autarquia fluminense. A PixBet é a segunda plataforma da indústria a receber licença de operação da Loterj, que começou a atuar poucos dias após ser credenciada.

Ernildo Júnior Farias e Tadeu Dantas, acionistas da PixBet, e parte da equipe técnica da empresa foram recebidos pelo presidente da Loterj, Hazenclever Lopes Cançado. Durante a conversa, a operadora elogiou o pioneirismo da autarquia na legalização das apostas esportivas e dos jogos on-line no país.

No início de agosto, oito empresas entraram em processo de credenciamento no Paraná para operar apostas esportivas. A autarquia Lottopar avança em direção à implementação do serviço público de loterias após a publicação da MP das apostas. O processo já está em fase final, e as companhias deverão apresentar um plano operacional, além de comprovar a capacidade operacional a partir do licenciamento por autoridades regulatórias internacionais, juntar-se à plataforma de Gestão e Meios de Pagamento contratada pela Lottopar e fornecer as garantias de execução do contrato e de pagamento da outorga.